Na opinião do historiador e cientista político, a votação mostra que o ‘bolsonarismo se enraizou’ na sociedade brasileira e, se o ex-presidente conseguir ser eleito no segundo turno, enfrentará um ‘Congresso totalmente hostil’ e terá para lidar com ameaças e agendas de impeachment -bomba. Os resultados do primeiro turno das eleições de 2022 indicam, na opinião do historiador e cientista político Luiz Felipe de Alencastro, que o bolsonarismo se enraizou na sociedade brasileira e que, mesmo sendo eleito, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva ( PT ) enfrentará um “terceiro turno” diante de um Congresso hostil ao seu governo.
Além de um voto muito mais expressivo em Jair Bolsonaro (PL) do que as pesquisas indicavam, Alencastro destaca a eleição de vários senadores e deputados federais alinhados ao presidente. “Foi uma vitória fantástica para o bolsonarismo, que agora está se enraizando no país, e para uma extrema direita com resiliência e talvez uma permanência muito longa”, diz o professor da Faculdade de Economia da Fundação Getúlio Vargas (FGV).
O historiador avalia que, mesmo obtendo mais votos do que as pesquisas indicavam, Bolsonaro terá dificuldades para ser reeleito porque ficou cinco pontos percentuais atrás de Lula na votação.
“Ele tem que recuperar isso e não tem muita reserva de voto, porque pode haver um acordo entre o PDT (Ciro Gomes, quarto) e o MDB (Simone Tebet, que ficou em terceiro) com Lula”, disse. diz.
“Por isso, ele não poderá fugir dos debates, quando não tiver a ajuda do padre (Padre Kelmon, acusado de ajudar Bolsonaro no último debate antes da eleição ao antagonizar o candidato do PT), e vai vai mano a mano com Lula, que é um debatedor mais experiente.”
Mesmo que o ex-presidente vença no segundo turno, deve ter muitas dificuldades políticas em seu governo, diz Alencastro, que foi professor da Universidade de Paris-Sorbonne, na França.
Esse prognóstico se deve ao fortalecimento do bolsonarismo no Congresso, segundo o historiador.
O PL, partido de Bolsonaro, ampliou sua presença na Câmara e elegeu a maior bancada, com 99 deputados, ante os atuais 76, segundo resultados preliminares. Deve ter também a maior bancada do Senado, com 15 deputados ao todo.
Das 27 cadeiras disputadas em 2022 para o Senado, 14 foram conquistadas por nomes apoiados pelo presidente, quatro deles ex-ministros de governo – Rogério Marinho (PL-RN), Marcos Pontes (PL-SP), Tereza Cristina (PP-MT) ). ) e Damares Alves (Republicanos-DF) – o ex-secretário Jorge Seif (PL-SC), além do vice-presidente, Hamilton Mourão (Republicanos-RS).
“É algo extraordinário e desequilibra o jogo. Acho que Lula ainda ganha, mas vai ter que enfrentar um ‘terceiro turno’ com um Congresso totalmente hostil e vai lidar com ameaças de impeachment e bombas de agenda, como projetos de lei que detonam o orçamento”, diz.
“Ou mesmo com uma proposta de alteração da Constituição para instituir o semipresidencialismo, que é uma ameaça no horizonte que foi quase uma alternativa ao impeachment de Dilma Rousseff (PT) quando (ex-deputado federal) Eduardo Cunha tentou implementá-lo e que, na minha opinião, seria um desastre total.”
No médio prazo, também pesa contra Lula, segundo Alencastro, o fato de ele ser quase dez anos mais velho que Bolsonaro e não ter herdeiros políticos.
“Enquanto Bolsonaro tem (o governador reeleito) Romeu Zema em Minas Gerais, (o governador reeleito) Cláudio Castro no Rio, talvez Onyx Lorenzoni no Rio Grande do Sul. Isso é uma ameaça não só para o PT, mas para toda a esquerda”, diz.
No entanto, as pesquisas trouxeram boas notícias para a esquerda, em sua opinião, com a “resiliência” do Nordeste, onde Lula venceu Bolsonaro em todos os estados.
“Foi algo muito positivo, porque mostra que o aumento do Auxílio Brasil e os esforços do governo Bolsonaro para ampliar os benefícios sociais e conquistar o apoio das camadas mais desfavorecidas não deram certo”, diz Alencastro.
“Isso desmascara um mito importante de que os pobres seguem uma liderança que fornece ajuda como essa.”
Por outro lado, a votação indica que “a extrema direita se firmou no país”, diz o professor da FGV.
“A centro-direita ruiu de vez com o surgimento do bolsonarismo, que foi favorecido pela erosão do aparato político tradicional, porque passou a ser percebido pelo eleitorado como representante do o status quo.”
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