Roteirista de longas de sucesso como “Central do Brasil” e “Deus é Brasileiro”, João Emanuel Carneiro já era reconhecido no cinema quando decidiu investir na televisão.
Na virada dos anos 2000, firmou-se como colaborador de Maria Adelaide Amaral em minisséries como “A Muralha” e “Os Maias”.
Incentivado por Silvio de Abreu e Denise Saraceni, João decidiu se candidatar a uma vaga no grupo de romancistas de sete horas e acabou entregando uma sinopse de novela para a alta direção da emissora.
Sem resposta, quase um ano depois, o autor estava prestes a ingressar como colaborador de Gilberto Braga em “Celebridade” quando teve a sinopse aprovada pela Globo.
Duas décadas depois, a história de “Da Cor do Pecado”, voltou ao ar na tela do canal pago Viva, mostrando todo o seu apelo popular, que fez da obra a maior audiência dos anos 2000.
Aos olhos do tempo, porém, a primeira novela protagonizada por uma atriz negra teria sérios problemas se fosse exibida hoje, em grande parte por causa de suas abordagens polêmicas sobre o racismo”, disse.assédio moral”, intolerância religiosa e homofobia, entre outras questões que ganharam mais força com o passar do tempo e o esclarecimento das agendas sociais.
Na trama, o envolvimento sexual do poderoso empresário Afonso e sua empregada Edilásia, personagens de Lima Duarte e Rosi Campos, acaba com ela grávida.
Não querendo magoar a mulher doente, Afonso abre o jogo com a mulher, que aceita dar frutos da traição. Pronta para fugir, Edilásia esconde da patroa que na verdade estava grávida de gêmeos.
Assim, deixa um dos meninos para ser criado por Afonso e foge com o outro.
Quase três décadas depois, Paco e Apolo, de Reynaldo Gianecchini, seguiram caminhos bem diferentes.
O primeiro é um botânico em uma eterna guerra de valores com o próprio pai, enquanto o segundo leva uma vida simples com a mãe e quatro meio-irmãos.
Em viagem ao Maranhão, Paco acaba se apaixonando por Preta, de Taís Araújo.
O amor à primeira vista dos dois é alvo de uma armação feita por Bárbara e Kaike, vilões de Giovanna Antonelli e Tuca Andrada.
Após um salto de oito anos, Apolo é supostamente assassinado por bandidos, enquanto Paco sobrevive a um acidente de helicóptero.
Pronto para desaparecer da vida cheia de mentiras, dor e traição que liderou, Paco toma o lugar de Apolo.
Surpreendentemente, ele reencontra Preta quando ela chega ao Rio de Janeiro, determinado a provar que o pequeno Raí, de Sérgio Malheiros, é o filho legítimo de seu antigo amor.
A forma mais intensa com que as situações são abordadas em “Da Cor do Pecado” levou o Viva a adotar uma atitude inédita: ao final dos capítulos, o canal exibe a mensagem “Este trabalho reproduz comportamentos e costumes da época em que foi feito”.
As novelas são uma lupa da realidade.
Dependendo do tom, esse visual pode ir muito além da história em si.
Carregado de ironia, o texto de João Emanuel usa humor e uma boa dose de realismo para mostrar um vilão que chama a menina de macaca e um rico empresário que também trata a protagonista com desdém, resumindo-a como uma grande garimpeira por causa da cor da sua pele .
Além disso, as subtramas revelam um pai de um santo pervertido e charlatão, Helinho, de Matheus Nachtergaele, ou Abelardo, um jovem de gestos e gostos femininos que muitas vezes é atacado por sua família por ser um pouco mais extravagante, papel defendido por Caio Blat.
Na época, as cenas pareciam banais.
Hoje em dia, o impacto do texto soa, no mínimo, desconfortável.
Apesar das situações polêmicas, a novela dribla suas polêmicas, que hoje chegam até o título – ao relacionar literalmente pecado e cor da pele – com a bela e simples história de amor interracial extremamente representativa que fez e ainda faz o público suspirar.
“Da Cor do Pecado” pode não ter envelhecido da melhor maneira, mas ainda tem muito valor.
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